Caro Leitor
Atuando com a advocacia, tenho percebido que muitos conflitos poderiam ter sido resolvidos ou até mesmo evitados antes de atingirem a esfera jurídica. Para a resolução dos conflitos, as partes podem optar pela maneira jurisdicional ou extrajudicial. Quando surgem os conflitos de interesses e as partes optam por resolvê-los na esfera judicial, ficam dependentes de alguns fatores, entre eles, a morosidade no judiciário brasileiro.
No entanto, aos poucos, a justiça brasileira está buscando novos caminhos para facilitar as soluções dos conflitos. Nosso atual Código de Processo Civil transformou as audiências de conciliação em uma fase obrigatória do processo. Nesta audiência, as partes têm a oportunidade de colocarem fim a uma divergência de forma amigável, ou seja, ocorre um acordo amistoso para findar um litígio. Devido ao grande número de processos tramitando, está havendo o estímulo de novas técnicas para facilitarem os acordos.
Temos, por exemplo, a Mediação, que é um meio extrajudicial de resolução de conflitos, onde uma terceira parte neutra ao conflito intervém por solicitação das partes e ajuda na solução do problema. As partes, com a assistência do mediador, buscam com equidade e consenso a resolução da controvérsia ou disputa entre elas.
Outra técnica que está ganhando espaço dentro do judiciário para a solução dos conflitos é a Constelação familiar. Longe de ser um fenômeno exclusivamente jurídico, o Direito de Família envolve questões da alma do ser humano, que está inserido nesta complexa instituição chamada Família, e a Constelação é uma técnica pontual que amplia a consciência dos litigantes (pessoas que estão em confronto). Esta técnica é usada no ato que antecede a mediação. Não é uma crença religiosa ou mística e é indicada para processos mais complexos, onde o conflito é resistente.
A constelação surgiu na década de 80, fruto de práticas vivenciais de um psicoterapeuta alemão chamado Bert Hellinger. Através de vivências de grupos, ele descobriu que existe uma consciência superior (consciência sistêmica) que rege as relações humanas, que cuida das famílias, no sentido de perpetuar a espécie numa forma justa e equilibrada. Uma lei universal que atua no mundo inteiro que entende que o antepassado pode influenciar nossa vida, principalmente quando não aceitamos ou quando negamos parte da nossa própria história.
A constelação é um avanço para a justiça, pois pode contribuir muito para a solução dos conflitos, tanto que há juízes que estão usando a dinâmica da constelação com os litigantes e têm tido ótimos resultados, aumentando o índice de acordo. Através da constelação, as partes conseguem retirar o véu que as impedem de encontrar uma solução. Enxergar problemas ocultos que impedem um acordo em um inventário ou em um testamento, por exemplo, ou que faz surgir a alienação parental, até mesmo o abandono afetivo. A dinâmica da Constelação Familiar pode resolver esses dilemas que fazem muitas pessoas sofrerem. Não é mágica, apenas uma questão de postura. Quando se muda a postura em relação a algo, os resultados tendem a ser diferentes. A ideia é humanizar a justiça, pois nem sempre uma sentença encerra um litígio. As pessoas não ficando satisfeitas com a solução da justiça, a chance de o conflito continuar é grande e é só uma questão de tempo para o surgimento de um novo processo para rediscutir a questão.
O conflito deve ser resolvido o mais rápido possível sob pena das partes arcarem com prejuízos com os quais não podem lidar.
Conflitos são naturais à existência, mas independente da esfera onde as partes buscam a solução de seus conflitos, o importante é estarem abertas às soluções apresentadas, pois quanto mais se prolonga um problema, mais se aumenta a chance de outros problemas surgirem. A vida passa muito rápido, permita-se viver em paz.
Já tive experiência com a constelação familiar e foi muito esclarecedora.
E você, está com algum conflito que precisa resolver? Já teve experiência com alguma técnica alternativa de soluções de conflitos? Foi satisfatório? Está com dificuldade em fazer acordo com a parte contrária? Será um prazer ajudar você a resolver o que te aflige. Estou à disposição.
Aproveitando a oportunidade, desejo-lhe um Natal Feliz, com muita saúde, paz, sabedoria e amor. Desejo também um Próspero 2020!
Abraço.
Prezado Leitor,
Você já ouviu falar em filiação socioafetiva? Sabe o que é multiparentalidade?
A sociedade está em constante transformação e o Direito acompanha essas mudanças. Desde 2011 os tribunais estão julgando diversas ações com pedidos de reconhecimento da filiação socioafetiva, que é o reconhecimento jurídico da maternidade e/ou paternidade, tendo como base o afeto. Não há vínculo de sangue entre as pessoas, apenas um homem e/ou uma mulher cria um filho como seu, mesmo não sendo o pai ou a mãe biológicos da criança ou adolescente.
A filiação socioafetiva tem amparo legal não só na jurisprudência, mas também no artigo 1593 do Código Civil, onde consta que o parentesco é natural ou civil, conforme resulte de consanguinidade ou outra origem, ou seja, a filiação socioafetiva gera um parentesco civil.
A socioafetividade surgiu do afeto, do amor. É muito mais que o meramente biológico.
Imagine esta situação: o pai que registra o filho e nunca mais o vê. Este filho é criado pelo padrasto. Cria-se o vínculo afetivo entre eles. Neste caso, o padrasto entra com o pedido de reconhecimento desta filiação. Eis a filiação socioafetiva.
Hoje os tribunais têm julgado de forma maciça que o pai/mãe meramente biológico(a), poderá ser retirado(a) da certidão de nascimento, cedendo o direito ao pai/mãe socioafetivo(a). O pai/mãe socioafetivo(a) está sobrepondo o meramente biológico.
Agora imagine estas situações: consta na certidão de nascimento o nome do pai e da mãe biológicos. Na primeira situação, eis que o casal se separa. O padrasto criou a criança como se filho fosse. Porém, o pai biológico continuou cumprindo com o papel de pai. Ainda assim, o padrasto quer colocar seu nome na certidão de nascimento da criança, tamanho o vínculo afetivo criado entre eles.
Na segunda situação, após o falecimento da mãe no parto, o pai cuida da criança e depois constitui família com outra mulher. Esta, cria a criança como se sua fosse.
Nestes dois casos, pode haver o pedido do reconhecimento da filiação socioafetiva. Os tribunais estão decidindo que é possível a inclusão do pai/mãe socioafeitvo(a) na certidão. Sendo assim, constará o nome da mãe e de dois pais ou também de duas mães e um pai na certidão da criança. Lembrando que, neste caso, constará na certidão o nome de seis avós.
Como consequência, a filiação socioafetiva fez surgir a multiparentalidade, ou seja, o mundo jurídico reconhece o que ocorre no mundo dos fatos, dando o direito da convivência familiar que a criança/adolescente adquire por meio da paternidade/maternidade biológica em conjunto com a paternidade/maternidade socioafetiva.
Em 2016 o Supremo Tribunal Federal – STF julgou um processo de Santa Catarina permitindo a concomitância de paternidade ou maternidade afetiva e biológica. Depois deste julgamento, o Conselho Nacional de Justiça – CNJ, expediu um Provimento em 2017 e autorizou a possibilidade de reconhecer uma maternidade ou paternidade socioafetiva diretamente em cartório, sem precisar ajuizar uma ação judicial, desde que cumprido alguns requisitos.
O reconhecimento da filiação socioafetiva é feito por meio de dois requisitos: o trato entre as pessoas como pais e filhos e o reconhecimento da sociedade que essas pessoas vivem como pais e filhos.
Vale lembrar, que a multiparentalidade gera efeitos jurídicos em relação ao nome, aos alimentos, à sucessão, à previdência social. Para que esses efeitos jurídicos existam, é necessário o registro dos nomes na certidão.
Você conhece alguém que tem dois pais ou duas mães em seu registro?
Tem alguma dúvida sobre este assunto? Estou sempre às ordens para esclarecê-la.
Abraço forte!
Prezados Leitores
Temos constituído na Constituição Brasileira o princípio básico que é o da dignidade da pessoa humana. A partir deste princípio, surgem os direitos e garantias fundamentais. No entanto, existem aquelas pessoas que são incapazes de invocar e gerir seus próprios direitos e interesses, ou seja, não têm a capacidade civil.
A capacidade civil é a capacidade que o ser humano tem para praticar os atos da vida civil, como abrir conta em banco, adquirir plano de saúde, postular em juízo, casar, enfim, tomar decisões durante a vida.
Infelizmente, algumas pessoas nascem com deficiências (pessoas especiais) ou por alguma doença, no decorrer da vida podem perder a capacidade civil.
Quando se tem filhos, são menores e por isso são incapazes. Atingindo a idade de 16 anos, são relativamente incapazes, sendo responsáveis por alguns atos e os pais responsáveis por outros. Quando atingem a maioridade (18 anos) passam a ser capazes. Assim, os pais deixam de exercer a tutela sobre eles.
Tutela é o poder de guarda, de decisão, exercida por uma pessoa capaz sobre o incapaz, em função da idade.
Na ausência dos pais, por morte, ou por terem sido destituídos do poder familiar, o Tutor é aquela pessoa a quem é conferido legalmente o encargo de proteger, orientar e defender o incapaz, ou seja, vai reger a vida da criança ou adolescente até que complete a maioridade. Portanto, a tutela cessa com o tempo.
A decisão de retirar de uma pessoa maior a capacidade de gerir sua própria vida não é nada fácil, mas muitas vezes necessária.
Para essas pessoas o Código Civil instituiu a Curatela.
De acordo com o artigo 4º do nosso Código Civil, são incapazes, relativamente a certos atos ou à maneira de os exercer: I - os maiores de dezesseis e menores de dezoito anos; II - os ébrios habituais e os viciados em tóxico; III - aqueles que, por causa transitória ou permanente, não puderem exprimir sua vontade; IV - os pródigos.
Pródigo é aquela pessoa que se revela por um gasto imoderado capaz de comprometer seu patrimônio.
A Curatela é o poder de guarda, decisão, exercido por uma pessoa capaz sobre uma pessoa incapaz que atingiu a maioridade.
Neste caso, é instituído legalmente o Curador, com os atos que poderão ou não praticar em relação ao incapaz. É o curador que vai gerenciar os negócios, administrar os bens daquele incapaz, por meio da interdição, que é o resultado da apuração da incapacidade da pessoa para os atos da vida civil. O juiz declara por meio da interdição que a pessoa terá um Curador.
A Curatela não cessa com o tempo, exceto por situação especial. Por exemplo, uma pessoa que entrou em coma (causa transitória de incapacidade), temporariamente não será capaz de gerir sua vida, logo, precisará de um curador. Assim, temporariamente, enquanto estiver em coma, terá um curador.
Imagine a situação onde uma mãe sofre de Alzheimer e tem dois filhos. Um filho estando de acordo que o outro seja curador da mãe, ótimo. Aquele filho será nomeado curador. Havendo discordância entre os filhos, teremos uma “batalha” judicial e então o juízo e o Ministério Público decidirão qual dos filhos será mais adequado para ser o curador.
A curatela pode ser requerida por ascendentes, descendentes, cônjuges, parentes e Ministério Público.
Numa ação de curatela, participam do processo, a pessoa a ser interditada (o incapaz), o(s) candidatos(s) a ser(em) curador, o promotor de justiça, representando o Ministério Público e defendendo os interesses da pessoa que está sendo interditada, pois onde há interesse de incapaz, sua participação é obrigatória, o juiz e o perito judicial (normalmente o médico), que irá atestar a incapacidade.
Embora a justiça sempre vá nomear um perito, é prudente que o candidato a curador já tenha um atestado médico descrevendo todo o quadro daquela pessoa que será interditada, constando se é capaz ou incapaz, e se a incapacidade é reversível, contendo do número da CID (Classificação Internacional de Doenças). A CID não é estritamente necessária, desde que o médico descreva especificamente o quadro e a doença. São necessários outros documentos das partes envolvidas, inclusive, declarações de bons antecedentes e outras declarações de parentes, se for o caso.
Geralmente, a questão da curatela é pensada quando as pessoas estão passando por momentos difíceis, tensos. Por isso, é importante que procure informações com profissionais aptos para que, futuramente, não surjam outros problemas.
Abraço forte!